Relato de nossa experiência em abril de 2025
(Carolina Soares, Cristiane Damico e Rafaela Lopes)
Decidimos incluir a escalada no Lenheiro em nossa viagem e, no último dia do prazo, uma semana antes, enviamos o formulário de autorização e responsabilidade do CEMONTA. Planejamos sair do Rio na quinta-feira às 6h para aproveitar mais o dia e evitar o trânsito. Como Cris e Rafa tinham disponibilidade e Carol precisava chegar a tempo para trabalhar, essa escolha se mostrou super acertada!
Depois, começamos a monitorar a previsão do tempo para o feriado de Páscoa, que não estava favorável. Havia previsão de chuva, com uma única janela sem precipitação na sexta-feira. Esse passou a ser nosso dia escolhido para escalar. Começamos a estudar o Guia da Serra do Lenheiro (72 páginas, vários setores, mil vias! – como disse Cris), que, por sinal, é gratuito, bem detalhado e acabou de sair a edição 2025. Também pedimos dicas aos amigos do CEC sobre as melhores vias – e viáveis (rs).

Guia da Serra do Lenheiro
Com uma lista de vias que queríamos fazer, mas que estavam acima do nosso grau de guiada e ainda eram em móvel, acertamos as guiadas com o escalador Pedro Naves, referência na região, super gente boa, e um dos autores do guia. Ele também é dono do Abrigo Lagos, um local acolhedor na área, que fomos conhecer.
Na sexta-feira, saímos cedo do centro de São João del Rei e chegamos por volta de 7h30 na entrada do CEMONTA. Do centro de SJDR até Lenheiro, são aproximadamente 15 minutos de carro. Ao chegar no parque, não encontramos ninguém na entrada –e não havia sinal de outros escaladores. Encontramos Pedro e iniciamos a pequena trilha até o setor Três Pontões, fazendo uma primeira parada para observar as pinturas rupestres antes de seguir para nossa primeira via: Variante Teto Guerra e Paz (V – 15m – Mista). Belo teto em horizontal, um sonho de escalada da Cris, e que rende fotos incríveis.

Pinturas rupestres
Ao chegar à base, já bateu um frio na barriga – havia apenas um grampo no meio da via, dois pítons, e a parada nem se via, ficando um pouco acima do final da variante, já na outra face da pedra. Como estávamos com duas cordas e Pedro trouxe mais uma, conseguimos fazer um esquema eficiente: a primeira ao finalizar já ia rapelando, e a participante do meio levava as demais cordas.
Curiosamente, por ser Sexta-feira Santa, escalamos o teto ouvindo ao fundo as orações de um grupo reunido em um monte próximo.

Cris finalizando a Variante Guerra e Paz
O visual e a via são incríveis, mas a escalada foi puxada. Todas pararam no único grampo para descansar os braços, que já davam sinais de fadiga. E o crux ainda estava por vir: um lance de equilíbrio onde as mãos somem, exigindo uma transferência de pés um pouco delicada. Pedro, prevendo a dificuldade, ainda colocou um nut para garantir nossa segurança no crux. Depois, seguimos para a segunda via: que inicia e vai até a metade da Esquina da Alegria (IV – 30m – Fixa) até entrar na Spartacus (IVsup – 35m – Móvel), uma bonita fenda que leva ao cume, de onde curtimos uma vista 360° da Serra do Lenheiro.

Rafa na fenda da via Spartacus

Cume pela via Spartacus com o guia Pedro

Visual deslumbrante do cume
Para fechar o dia, pensamos em entrar na clássica Dança Macabra, mas acabamos optando por uma via conquistada e recomendada pelo nosso guia, a Barbatana (IVsup – 25m – Fixa). Uma via bem interessante, com movimentações variadas: começa fácil, passa por um platô, entra em uma pequena chaminé e, em seguida, exige uma movimentação em tesoura para acessar a aresta. Há um lance que é preciso dar um “Galeio” (deve ser termo mineiro…) e o trecho final tem um lance em negativo, mas com uma ótima agarra de mão. Finalizamos o dia empolgadas e já planejando voltar ao Lenheiro se o tempo ajudasse!

Carol na chaminé da via Barbatana
Domingo no setor Bloco dos Dois Dedos – por nossa conta!
Retornamos ao Lenheiro pela manhã, desta vez para o setor Bloco dos Dois Dedos, que fica à beira da estrada de quem sobe para o CEMONTA. Esse setor tem vias mais acessíveis, e era a melhor oportunidade para tentarmos guiar algo.
Na noite anterior, “estudamos” as vias e selecionamos três para entrar, levando em consideração que não fossem vias com proteções móveis.
A primeira via escolhida foi Boca Murcha (IIIsup – Fixa – 10m). Encontramos a base sem dificuldades e todas entraram e guiaram sem maiores problemas, exceto pela altura, que dificultou a vida de alguém… rs

Cris guiando a via Boca Murcha
Animadas com a guiada e sem recorrer ao clipstick, seguimos para a próxima via da lista: Chapeleta (IV – 20m – Fixa). Chegamos à base e sentimos uns pingos, que logo passou. Ao analisar a via, avistamos uma barriga ao final que nos assustou um pouco – como faríamos esse lance? Mas decidimos entrar.
De fato, o trecho final exigia mais: um pé alto para superar a barriga, pedindo leitura atenta dos movimentos. Passado o lance, ao chegar na parada, nos deparamos com um visual incrível ao redor!

Rafa guiando a via Chapeleta
Mais animadas, seguimos com o plano para a última via da lista: Vacinados (IV – Fixa – 25m). Era um pouco mais distante das outras vias, então seguimos contando as chapeletas e conferindo a numeração no guia até chegarmos à base.
Assim que analisamos a via, percebemos que seria mais difícil: era vertical, exigindo equilíbrio e mobilidade. Diferente das anteriores, não era de agarras, mas de abaulados. Avistamos apenas as duas primeiras chapeletas; depois, a parede se inclinava num platô e seguia por um bloco de pedra vertical, onde conseguimos ver mais duas chapeletas e a parada. Detalhe: as chapeletas não eram rapeláveis!
Rafa e Carol tentaram entrar na via, mas sem sucesso. Resolvemos usar o clipstick para costurar as duas primeiras proteções antes de tentar novamente. Carol subiu até um pouco acima da segunda chapeleta, mas não conseguiu dominar o lance, que parecia delicado e jogava para fora. Desistimos, mas não bastava simplesmente descer – como recuperar a costura sem abandonar nada? Nessa hora, conhecimentos e ideias a postos, Rafa e Cris debatiam estratégias, já Carol pensava mais o quanto iria cair… (rs).

Carol na tentativa de guia a via Vacinados ou Esperança
A solução encontrada foi usar uma fita longa e uma panic para remover a costura e descer até a segunda chapeleta, repetindo o procedimento. Para conseguir retirar as costuras, era preciso se equilibrar e dar um leve. No final, tudo deu certo, e já estava na hora de seguir para o almoço de Páscoa na casa da avó da Rafa.
No caminho, seguimos conversando sobre a via que não conseguimos fazer. Algo estava estranho – no guia, o grau era igual ao das outras que havíamos feito. Mas nossa experiência foi completamente diferente!
Foi só ao relembrar e começar a escrever este relato que percebemos que provavelmente, não entramos na via Vacinados, mas sim em uma via chamada Esperança (V – Fixa – 12m). A descrição do guia fazia muito mais sentido: “Via com saída em abaulados, seguida por um rampado fácil e depois um trecho mais vertical até a parada dupla.”
Ao contrário da descrição da Vacinados, que dizia ser “positiva e bem protegida, ideal para treinar equilíbrio e para quem está começando a guiar.”
Nossa avaliação? Nada positiva e definitivamente não para iniciantes!
Finalizamos esses dias de escalada com uma sensação de realização, independência e progresso. Conseguimos escalar vias à vista, sem croqui, apenas com referências de grau, descrição, e proteção, e o mais importante, em segurança!
Foi uma conquista pessoal para cada uma de nós. Temos praticamente o mesmo tempo de escalada e foi incrível perceber o quanto evoluímos.
PS: Se alguém for ao Lenheiro em breve, por favor, entra na via Vacinados! E nos conte se ela realmente é boa para quem está começando a guiar..rs

Rafa, Carol e Cris no final da via Boca Murcha