RESPONSÁVEL
DATA DA ATIVIDADE

05/08/2023

RELATO POR

Paula A. Caetano da Silva

PUBLICADO EM

7 de agosto de 2023

CATEGORIA

Na primeira vez que vim a esse lugar, nem imaginava escalar, foi em 2016 e acampei no vale dos Deuses, acordei com a vista pra essas lindas montanhas, Capacete, Pico Menor, Medio e Maior. Na ocasião vi alguns “doidos” escalando no Capacete e pensei, que loucura, não teria essa coragem 🤭🙈

Menos de um ano depois, cá estava eu, fazendo curso básico de montanhismo no CEC, conhecendo escaladores e escutando muitas histórias desse lugar e suas vias de escalada e conquistadores. Histórias inspiradoras, de desafio e acima de tudo muito respeito com a montanha. Aproximação pesada, vias longas, expostas e que exigem grande comprometimento.

Terminei o curso básico em abril de 2017, e realmente o “bichinho” da escalada me picou! Descobrir novos ângulos do Rio, desafiando meu corpo e mente, é algo que até hoje tenho dificuldade de descrever em palavras, comecei a escalar e desde então não parei mais.

Em fevereiro de 2018 tive o privilégio de escalar pela primeira vez, em Salinas, Três Picos, lembro da imponência e do medo que senti ao chegar na base da via Cerj, na ocasião o plano era fazer a Fata Morgana no Capacete, mas infelizmente alguns fatores nos fizeram abortar quase na P5 dessa via. Mas mesmo assim tinha sido uma das experiências mais incríveis que vivi na escalada até então. Em junho do mesmo ano, por sorte e coincidência, tive a oportunidade de conhecer outra via, Rodolfo Chermont, e fiz meu primeiro cume em Salinas. Considero a mesma, uma via mais “urbana” lá, tem apenas 140m e é um E1, raridade por lá, rs, mas ainda sim foi muito especial chegar ao cume dessa montanha pela primeira vez.

No ano seguinte tive a oportunidade de conhecer uma clássica da região, a Cerj, uma linda via, diversificada, generosa em agarras, com pequenas chaminés, uma aderência que “gruda” e até uma horizontal para apimentar a vida do participante! Rs! Quando fiz a mesma, jamais imaginei que um dia viria a guiar ou revezar ela, lembro que, apesar de escalar sem grandes dificuldades, a grande exposição e o fato de “não poder cair”, era algo que tornava isso um sonho bem distante.

Aí em 2020 veio a pandemia… praticamente 6 meses sem escalar, depois fui voltando bem aos poucos, e parando devido ao aumento da covid em certos momentos.

Em 2021 voltei para Salinas, pós pandemia, tinha voltado meu foco para escalada, e estava fazendo bastante volume, havia guiado muitos vias no Rio e na Serra, e finalmente começava a me achar preparada para “arriscar” guiadas na região, e finalmente aconteceu, guiei alguns trechos da via El Kabong e outros da Mundo da Lua, porém, mais uma vez, por fatores externos não foi possível fazer cume em nenhuma delas.

O ano é 2022, e mais uma vez tenho a oportunidade de escalar nos Três Picos, dessa vez o grande objetivo da viagem era a sonhada Leste, no Pico Maior. E agora sim, dessa vez deu tudo certo, no primeiro dia apesar da péssima previsão conseguimos escalar rápido e fizemos a Sergio Jacob no Capacete, assim que chegamos no cume, começou a chover. No segundo dia fomos então conhecer o cume da Caixinha de Fósforo, embora seja uma curta escalada em artificial, considero um dos visuais mais bonitos de cume que já estive, então valeu muito a pena, e no terceiro dia, finalmente saiu a tão esperada Face Leste do Pico maior, outra via que realmente merece o título de “clássica”, lindos 700m de escalada. Em todas essas escaladas, não tive a oportunidade de guiar/revezar, na verdade nem me sentia preparada para tal, devido a toda logística, agilidade e técnicas que as vias exigiam.

Agora, finalmente em 2023, coloco como objetivo revezar uma via em Salinas, marcamos a data da festa junina no clube e ali seria a grande oportunidade, a via escolhida foi a El Kabong, já conhecia uma parte dela, e queria conhecer ela toda, porém o tempo não ajudou, choveu, e não rolou. :( Contudo ainda na festa, agendamos nosso retorno para escalar lá, e a data escolhida era 05 de agosto. Alguns imprevistos aconteceram e minha dupla não pode ir, com isso desanimei um pouco de fazer a El Kabong pois era um “projeto” nosso, mas não queria perder provavelmente a última oportunidade de escalar na região ainda nessa temporada, então inicialmente me juntei a Bimbi e ao Marcelo que iam escalar lá no mesmo final de semana, para formarmos uma cordada de 3. A via escolhida foi a Cerj, via essa que ja tinha feito participando, e era mais factível, então achamos que era a melhor opção. Duas semanas antes da viagem, em uma reunião social no clube conversando com o Gustavo Soares, sócio antigo do clube que está de passagem pelo Brasil, descobri que ele estava procurando parceria para ir para Salinas, com isso dividimos uma cordada de 3 em duas cortadas de 2, o que considero uma escolha muito acertada. Eu e o Gustavo nunca tínhamos escalado juntos, mas sabia que ele tinha larga experiência em montanhas, e já tinha escalado diversas vias em Salinas, então fiquei bastante feliz com a proposta, escolher a parceria certa considero algo crucial, não apenas em Salinas, mas em todas as escaladas, principalmente escaladas de comprometimento na Serra.

Ufa! Falei muito até agora, rs, mas estou apenas começando rs! Precisava introduzir contando  um pouco toda minha história com essas montanhas tão especiais.

Ao longo da semana combinamos a logística, dividimos o que cada um levaria e combinamos os horários, já que o Gustavo iria sair na sexta feira por volta das 15h, e eu, Bimbi e Jéssica por volta das 20h. Aliás sair as 20h foi uma decisão muito acertada, em exatas 3h chegámos no Abrigo Refugio das Aguas (Ro e Serginho Tartari), não pegamos congestionamento algum \o/.

Acordamos todos as 4h30, seríamos duas cortadas da Cerj e queríamos começar o quantos antes. Saímos de carro do abrigo as 5h40, paramos no estacionamento na entrada do parque, de lá subimos a pé até o Mascarim, onde resgatamos nossas mochilas e depois em direção a Sede, onde abasteci minhas garrafas com agua. Chegamos na base na Cerj por volta de 7h10. Conversamos e decidimos não francesar o inicio, eu não conhecia bem a navegação da via, então achei que acabaríamos não ganhando tempo. Com isso o Gustavo começou guiando a primeira enfiada por volta das 7h30, colocou um cam #.75 na laca, dominando o lance pela fenda, e rapidamente chegou na P1. Eu fui em seguida, confesso que demorei um pouco para ler o lance de IV da saída, mas depois que passei ele foi um esticão bem tranquilo e rapidamente cheguei na P1. Sai guiando o segundo esticão, é um esticão bem fácil, acabei pulando um grampo, pois achei que por conta da reforma a via estaria toda em chapeletas, então achei que esse grampo antigo era da Fata Morgana, mas depois descobri que é uma parada dupla da P1 da Fata Morgana, mas esse grampo pertence sim a Cerj, o lance era bem tranquilo, então a exposição não foi um problema para chegar na P2. O terceiro esticão foi guiado pelo Gustavo, que mandou super bem, ele começa em uma chaminé, onde é possível proteger com um cam #1 dentro dela, onde ele subiu “chaminezando”, com a mochila pendurada na solteira, mas logo ele mudou para tesoura pisando em cima de uma grande agarra e protegendo uma fendinha vertical do lado direito com um cam #.4, depois ele seguiu em tesoura mais uns dois lances e saiu em agarras para a direita, Gustavo  seguiu tocando, protegeu um trecho vertical com um cam #3 e dois bicos de pedra com fita, ele optou por esticar alguns metros após a P3 do croqui dos 50 clássicas, até parar em uma dupla que descobrimos ser “nova”. Quando cheguei era minha vez de tocar, ficamos um pouco em dúvida com relação ao croqui, onde estávamos exatamente, pois essa parada não existia no croqui. Na hora entendi que estávamos mais acima, bem perto do platô do sorvete, e pelos meus cálculos só teria uma chapeleta entre a nossa P3 e a P4, por isso após costurar a primeira chapeleta, fui em busca de colocações moveis, já que segundo meus cálculos a próxima proteção seria a parada dupla da P4 (plato do sorvete), contudo fui subindo por uma fenda que achei suja, mas como tinha moveis segui, quando cheguei ao final dela, olhei para minha esquerda, e vi uma chapeleta na parede ao lado, de jeito que não conseguiria chegar nela em segurança. Ficamos analisando, poderia fazer o lance sem costurar, mas precisaria de um cam #3, e eu tinha usado ele justamente no inicio da fenda, tentei desescalar, mas não achei uma boa ideia, pois o trecho estava sujo, vi então um platô acima mais a direita, e consegui colocar um cam #.75, assim diminui minha exposição, porém estava fora da via. Conversamos, eu poderia ter descido desescalando, com a corda de cima, retirar o cam #3 e voltar, mas achei arriscado e perderíamos muito tempo, enquanto pensávamos na melhor solução, Marcelo e Bimbi chegaram na P3, decidimos então que seria melhor o Gustavo tocar pela linha correta, com a segurança da Bimbi/Marcelo, e eu esperaria ele chegar na parada para com corda de cima, voltar para a “via”.  Fizemos assim e deu tudo super certo, acho que foi uma decisão acertada, e facilitada por estarmos em duas cortadas próximas, o que acho super recomendável quando se trata de Salinas. Acredito que foi um erro “importante” para meu aprendizado, conseguimos pensar em algumas soluções e acho que optamos pela mais rápida e coerente, foi bom também porque nos trechos seguintes fiquei mais “ligada” para não sair da via novamente. Seguimos o plano inicial, que era eu guiar as enfiadas pares, então a quinta enfiada (saindo do platô do sorvete) o Gustavo guiou sem problemas, a primeira proteção é um pouco alta, e começar em um lance de oposição onde é possível proteger com um móvel. mas o Gustavo preferiu tocar direto para a chapeleta, ele seguiu guiando esse esticão mais vertical sem problemas. Ao chegar na P5 era minha vez de guiar novamente, era a enfiada do crux, confesso que estava um pouco adrenada pelo erro anterior, mas  organizei a mente, não pensei muito e sai guiando. Para chegar na primeira chapeleta fiz umas passadas em tesoura, o mato atrapalhou um pouco, mas dessa forma segui bem solida ate a primeira proteção, segui guiando o restante da enfiada sem problemas, é uma das enfiadas mais protegidas, tem algumas colocações moveis, e o crux é um lance em horizontal bem melhor para o guia, cheguei então as 11h20 na P6 e puxei o Gustavo, que veio sem problemas. O sétimo esticão é o artificial, que o Gustavo fez sem problemas, mas apesar dele ser bem alto, teve que dar algumas passadas em livre para chegar na proteção seguinte, no final do artificial tem um lance de boulder que deve ser feito em livre, a dica é que tem uma agarra muito boa na mão esquerda alta que ajuda muito no domínio. Cheguei na P7 e já organizei para sair tocando, a oitava enfiada é bem fácil, a dica é seguir a segunda canaleta a esquerda, mas sempre prestando atenção na parede da direita, quando avistar a parada dupla é a hora de sair, dá para proteger em móvel nessa canaleta, mas é bem de boa, então não precisa muito. Ufa quase lá, estávamos na P8, o nono e último esticão ficou para o Gustavo, embora seja uma enfiada bem fácil, a navegação é meio esquisita, ele tocou reto e protegeu com uma peça móvel, quando olhou para esquerda viu que já estava quase pulando a segunda chapa da via, fez uma horizontal e voltou para costurar a segunda chapa, de lá até o final a via segue em um II grau e ele seguiu até o fim sem problemas. Ficamos ali conversando em por volta das 13h30 estávamos todos na parada finada via! Cumeeeeee!!!

Aproveito mais uma vez para agradecer ao Gustavo Soares a parceria, incentivo e confiança, afinal ele topou essa acordada em Salinas comigo, sem nunca termos escalado juntos antes. Ainda tivemos o privilégio de avistar dois pontinhos laranjas no cume do Pico Maior, eram Adriane e Rapha Santiago. Ficamos um pouco no cume e seguimos para o rapel na Sergio Jacob, de onde pudemos observar toda a descida dos rapazes que estavam rapelando pela Cidade do Ventos. Terminamos nosso rapel, a dica é fazer um rapel de 30m e dois de 60m, é realmente uma forma “expressa” de descer no Capacete. Após guardamos tudo e começarmos a descer a trilha, ainda encontramos os rapazes vindo do Pico Maior, se tivéssemos combinado não teria dando tanto certo! :D

Depois foi só alegria! Chegamos no abrigo e um delicioso rodizio de pizza nos esperava, não tardou muito e logo depois chegaram Gabi, Jessica e Marquinhos que se juntaram a nós.

É isso, acabou que no dia 05 de agosto de 2023, virou uma mini invasão Cequiense em Salinas. Eu e Gustavo Soares, Bimbi e Marcelo fizemos a Cerj, Adrian e Santiago fizeram a Face Leste no Pico Maior, Gabi, Jessica e Marquinhos fizeram a El Kabong. Que venham muitas outras!!!

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